domingo, 26 de julho de 2009

A CASA FORMIGAL CAMPONAL E A HISTÓRIA DAS FORMIGAS (Ensaio ficcional).




Era uma vez, há muito, muito tempo... em um formigueiro muito distante daqui. (Me contaram que fica na longínqua Amazônia, no Município de Presidente Figueiredo, mas isto foi antes daquele lugar ser município e antes de João Batista de Oliveira Figueiredo ser Presidente!). Era um formigueiro com toda a estrutura organizacional mimercológica. Havia lá , como é de costume entre estes insetos, a Rainha, as sentinelas, as operárias e as enfermeiras. E os setores que mais chamavam a atenção e preocupavam aquele formigueiro eram a floresta e a educação. A floresta porque é a fonte de onde as formigas tiram seus alimentos, seus agasalhos e a estrutura de suas casas. E a educação porque é através dela que as formigas têm instrumentos de organização para cuidarem da biodiversidade e da sustentabilidade. Era uma grande comunidade formada de formigas ágeis, trabalhadoras, de ajuda mútua, fiéis e protetoras umas das outras (salvo as exceções que existem em toda comunidade animália).
Pois bem, naquele formigueiro havia uma escola formigal camponal, que era diferente das escolas convencionais (ou comuns entre as formigas). Aquela instituição formigal era como uma fraternidade entre todas e todos (ou quase todos), operárias, filhos/as de operárias campônias... Era como uma família onde havia a divisão do Trabalho: uma operária cuidava da alimentação; outra operária cuidava da manutenção; outras formigas (o Aldei, a Flor e o Cuidado) trabalhavam com a Educação propriamente dita em suas áreas de ensino e aprendizagem e o faziam de forma cooperativa. Obviamente, para ser uma escola, havia as formigas estudantes ou, como eram chamadas, Educandas e Educandos. Estas formigas além de estudarem as ciências, as tecnologias campônias, os aperfeiçoamentos, aprendiam também sobre a organização doméstica, social, política, cultural e ambiental. Na escola formigal camponal as formigas jovens aprendiam a cultivar vegetais tradicionais e outros diferentes, sempre atentos para a biodiversidade local e o uso de tecnologias que não prejudicassem o seu habitat.
Naquela escola era um ir e vir constantes. Formigas Educadoras e Educandas estavam em permanente movimento (pois isto é próprio das comunidades formigais), indo para o ‘tempo escola’ ou voltando para o ‘tempo comunidade’, ou para as visitas de acompanhamento e apoio técnico às famílias... As formigas estudantes quando retornavam para a comunidade levavam consigo um plano de atividades para realizarem com a família. Quando retornavam (sempre em semanas alternadas) traziam a contribuição de suas famílias, de seu contexto vital e de sua comunidade para a escola formigal. Nesta o desenvolvimento dos estudos e do saber partia sempre do conhecimento empírico (vivência, experiência) para chegar ao conhecimento científico.
A organização, manutenção e subsistência da escola dependiam de suas associações e de todas as esferas políticas do formigal. Em resumo, dependiam de toda a nação de formigas e dos impostos pagos por suas cidadãs... Internamente havia uma formiga sentinela (a Ioven, delegada pela rainha) que era a responsável por dar organicidade a todo processo educativo daquela escola. Mas ela quase nunca estava lá, pois tinha que cuidar (dizia ela) da esfera política, dos acordos e de outras empreitadas com a rainha... Havia dois Educadores que trabalhavam com a área técnica e prática, mas sempre a partir da Transdisciplinaridade (ou seja, não em sua área isolada, mas ligada com as outras áreas científicas). Uma destas formigas (o Santi) era um educador (diga-se ‘professor’) que tinha uma formação convencional, conservadora, do jeito que o sistema capitalista das formigas gosta (treinada e ‘qualificada’ para ser explorada como mão de obra barata), estava voltada (na linguagem de hoje) para os interesses do agronegócio, um modelo de cultivo mercadológico, baseado na monocultura, no maquinário pesado (de alta tecnologia, à moda dos humanos), na utilização de químicos (venenos e adubos), na exportação (de commodities, termo inglês que significa ‘mercadoria’) e na busca do lucro... Esta formiga era na realidade apenas um ‘professor’, pois para engolir o pacotão do agronegócio tinha que ser uma formiga que não pensa, não analisa, apenas executa formulas prontas e acabadas, ditadas por outras “pesquisadoras da academia”. Esta formiga (para piorar as coisas) era a ‘informante’, a dedo duro, “os olhos e ouvidos da rainha”. Na verdade a coitada desta formiga não tinha a visão de totalidade da comunidade educativa, do formigueiro, da nação... Ela conseguia ver apenas seu umbigo, seus problemas pessoais, seu projeto de vida (diga-se nada independente do sistema!) e deixava-se usar pelos donos da situação! Deste modo ela se sujeitava aos interesses nada populares da rainha... A outra formiga (o Rosanova) era um educador que respeitava sua origem campônia e ainda permanecia no campo. Tinha sido formado em instituições que tinham apoio de organizações e movimentos populares (das formigas campônias). E não perdia as oportunidades para aperfeiçoar-se em cursos de educação popular. Esta formiga valorizava a Agroecologia (que foi a base de toda sua formação universitária), a autonomia política e econômica das famílias das formigas, a coletividade organizada e o conhecimento como instrumento de luta e transformação das condições de vida. Ela tinha uma dedicação e um cuidado especial com as jovens formigas (suas educandas) e suas respectivas famílias, a quem visitava seguidamente. Aliás, sonhava com a melhoria das famílias através da capacitação e organização, tendo em vista antes de tudo a produção de seus alimentos e a manutenção de suas condições de vida.
Porém, a rainha não gostava desta formiga (o Rosanova). Aliás, o acusava de ‘crime político’ e ‘processo judicial’. A bem da verdade a velha rainha queria vingar-se de outros desafetos, (operárias que tinham opção política diferente da sua) e que então não trabalhavam mais naquela instituição formigal. Como não podia, procurou fazer de Rosanova um “bode expiatório”. E as formas de pressão sobre as organizações da escola formigal foram tantas (desde calúnias, difamações, missivas...) que o Rosanova “ganhou a conta”... Grande presente depois de tanta doação por um Trabalho em que ele tanto acreditou! E isto teve desdobramentos!
As outras formigas educadoras (e auxiliares) sabiam que haviam perdido um grande companheiro, educador comprometido com a formação das formigas campônias. E as formigas jovens educandas sentiram-se órfãos daquela formiga que lhes era extremamente devotada. A formiga professor deve ter ficado muito bem (aquele que o levou nas costas por tanto tempo, bem...). E a formiga sentinela (braço da rainha naquela escola) como teria ficado depois que o ‘caminho foi aberto’? Não se sabe, pois estranhamente até os dias de hoje ela não retornou para anunciar... Ah, e a velha rainha, qual foi sua próxima obra para o bem das formigas? O drama continuou... E os seus súditos e suas súditas guardaram esta memória para a História!
Obs.: qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência, pois isto acontece todo dia pelo mundo afora!

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